Grau 6: Secretário Íntimo

Inspetoria Litúrgica do Estado da Paraíba – 1ª Região

0225 - LOJA DE PERFEIÇÃO PAZ E AMOR

FUNDADA EM 11 DE ABRIL DE 1972

CAMPINA GRANDE -  PARAÍBA

 

Grau 6 – Secretário Íntimo

 

Por Hiran de Melo

 

Pacíficos e Amados Irmãos,

 

A semelhanças dos graus anteriores trataremos este Grau em três etapas, ou partes.

 

PRIMEIRA PARTE

 

Testemunho de um Iniciado

 

Ser conduzido ao Grau 6 foi como atravessar uma nova porta — não só dentro da escada simbólica da Maçonaria, mas dentro de mim mesmo. A partir dali, não bastava apenas guardar os segredos: era preciso me tornar digno deles. A confiança não vinha por título — era construída, passo a passo, gesto a gesto, palavra a palavra.

 

Lembro claramente daquele momento solene: de pé, sem minhas insígnias, apenas com uma fita vermelha na mão — cor de sangue, de morte, de renúncia. Diante de dois reis, entre a ira de Hirão e a sabedoria de Salomão, entendi que meu destino pendia de um fio. E percebi: minha lealdade não era a um homem, mas a algo maior — à paz, à harmonia, ao serviço silencioso entre forças em tensão.

 

Foi nesse instante que nasceu em mim um novo papel. Não oficial, não visível — mas profundamente transformador. Ser Secretário Íntimo é muito mais do que anotar palavras ou guardar confidências. É estar disposto a agir com coragem moral, lealdade verdadeira e integridade até nos momentos escuros. Aprendi que há poder em calar, mas também há sabedoria em saber a hora certa de falar — com firmeza, mas sem arrogância.

 

Ao vestir os paramentos do Grau, cada símbolo parecia me falar. A carta selada? Compromisso com a palavra justa. O punhal? Coragem e firmeza de caráter. A chave? Acesso ao segredo — não só do outro, mas ao meu próprio abismo interior. Foi ali que entendi: o templo mais difícil de guardar é o nosso próprio coração.

 

Este grau me ensinou que existe um ponto de transição entre a contemplação silenciosa e a ação ética no mundo. Já não dava mais para ser apenas quem recebe a luz — era hora de ser a própria lanterna acesa. A confiança passou a ser a pedra fundamental do templo entre os irmãos. E a retidão, o fogo que o ilumina.

 

Mas foi no simples gesto de riscar uma folha em branco, com pontos e linhas traçados com reverência, que os mistérios começaram a se revelar. O primeiro ponto me mostrou o vazio que pede forma. O segundo, a dualidade que movimenta tudo. E o terceiro — o triângulo — me fez enxergar os ciclos sagrados: criação, preservação, transformação.

 

Ali, entendi que fé, esperança e caridade não são só palavras bonitas ou virtudes abstratas. São forças vivas dentro de mim. A fé que me impulsiona, mesmo sem garantias. A esperança que me ancora, mesmo no caos. E a caridade — não só como dar, mas como estar verdadeiramente presente no mundo do outro.

 

E se “a luz brilha nas trevas”, como disse João, percebi também que a sombra tem um papel importante. Não existe para apagar a luz — mas para revelá-la. O amor, nesse caminho, se mostrou sempre como o terceiro elemento: entre mim e o outro, entre mim e o sagrado, entre mim e a verdade.

 

Hoje, entendo que ser Secretário Íntimo não é apenas sobre guardar. É sobre cuidar da confiança alheia com reverência, da palavra com critério, e do silêncio com sentido. É saber que o poder não está em mandar — está em escutar. Que a palavra só vale se vier de um silêncio maduro. E que o amor, mais do que sentimento, é uma forma de conhecer o mundo e servir a ele com inteireza.

 

Sou um guardião de segredos. Mas mais do que isso, sou um servidor da verdade. E se há um chamado nesse grau, é este: que a nossa presença no mundo seja discreta, mas firme. Que nossas ações falem com mais clareza do que nossos discursos. E que cada segredo confiado a nós nos transforme antes de tudo.

 

SEGUNDA PARTE

 

Grau 6 - Secretário Íntimo:  Segundo a Visão de Albert Pike

 

Irmão, ao cruzar o limiar do Grau 6, Secretário Íntimo, você não apenas recebe um título, mas assume um compromisso profundo com os alicerces da confiança e da integridade.

 

Imagine-se nos aposentos secretos do Templo de Salomão, não como um detentor de poder ostensivo, mas como um confidente silencioso, cuja influência emana da discrição e da retidão moral.

 

Albert Pike, perspicaz observador da jornada maçônica, nos lembra que este grau marca uma transição crucial: o silêncio contemplativo do Mestre Secreto agora se transmuta em serviço consciente e ético no mundo profano e em nossos trabalhos. Aquele que aprendeu a guardar segredo, agora é chamado a falar com justiça e agir com sabedoria.

 

A Missão Silenciosa: Servir como Elo de Confiança

 

A essência do Secretário Íntimo reside na compreensão de que a verdadeira influência não se impõe, mas se conquista através da confiança depositada. Você se torna um elo vital, um conselheiro cuja voz ponderada e discreta ecoa nos corredores do Templo. Aprende que o poder genuíno floresce da integridade inabalável, mantida mesmo diante dos desafios e das injustiças.

 

Sua missão clama por:

 

Confidência Leal

 

Tornar-se um depositário seguro dos segredos e das preocupações, agindo com discrição em todas as circunstâncias.

 

Integridade Inabalável

 

Manter a retidão como guia, mesmo quando confrontado com a adversidade ou a tentação.

 

Fidelidade aos Princípios

 

Defender os ideais da Ordem com convicção, atuando como um farol de justiça e equidade.

 

Elementos simbólicos

 

A Carta Selada

 

Mais que um documento, representa a Palavra Verdadeira, o conhecimento que deve ser comunicado com discernimento e responsabilidade. É o compromisso de transmitir a verdade sem distorção, com a seriedade que ela merece.

 

A Chave da Confiança

 

Simboliza o acesso aos recessos da alma humana e aos mecanismos de uma governança justa. Abre não apenas portas físicas, mas os mistérios da consciência moral, da empatia e da compreensão fraterna.

 

O Punhal da Retidão

 

Representa a firmeza de caráter, a prontidão para defender a verdade e a justiça. É também o símbolo do discernimento ético, a capacidade de saber quando agir com determinação e quando exercer a prudência e a temperança.

 

Lições Morais para a Jornada

 

Neste grau, somos confrontados com ensinamentos que moldam nosso caráter:

 

Lealdade sem Adulação

 

Servir com dedicação, mas sem jamais curvar-se à bajulação ou ao servilismo.

 

Sigilo com Honestidade

 

Guardar os segredos da Ordem, mas sem jamais omitir a verdade quando a justiça o exige.

 

Coragem Moral

 

Aconselhar com integridade, mesmo diante do poder ou da oposição, priorizando sempre o bem comum e os princípios da Maçonaria.

 

O Elo entre o Silêncio e a Palavra

 

Após internalizar a sabedoria do silêncio no Grau anterior, o Secretário Íntimo aprende a arte de discernir o momento oportuno para falar. Sua palavra não é vazia ou movida pela vaidade, mas sim um instrumento de verdade e justiça. Ele aconselha com ponderação, impulsionado pelo dever fraterno, e age com justiça, guiado pela razão e pela equidade.

 

Ecos Filosóficos na Construção do Caráter

 

A jornada do Secretário Íntimo ressoa com a sabedoria de eras: o exemplo de José, o conselheiro bíblico cuja integridade o elevou; a prudência aristotélica, a virtude da sabedoria prática; e a resiliência estoica, o domínio da palavra e das emoções como caminho para a liberdade interior.

 

Reflexões sobre a Natureza do Poder

 

Este grau nos convida a contemplar a verdadeira essência do poder: desprovido de retidão, torna-se opressão; o saber sem ética é um perigo iminente; e a confiança, um tesouro inestimável, jamais se impõe, mas se conquista através da probidade e da lealdade inabalável.

 

Por enquanto

 

Irmão Secretário Íntimo, este grau o convida a um amadurecimento profundo. Você se torna um guardião não apenas de segredos, mas de princípios. Sua missão é ouvir com atenção fraterna, ponderar com sabedoria, comunicar-se com precisão e agir com fidelidade inabalável. Que sua jornada seja marcada pela busca incessante da Verdade e pela prática constante da Retidão, honrando a confiança que lhe foi depositada e servindo como um farol de integridade em nossa Augusta Ordem.

 

Exortação

 

Amado e Pacífico Mestre Irmão e Amigo

 

O Grau de Secretário Íntimo ecoa em nossos corações: confiança e retidão, pilares inabaláveis. Não sejamos meros depositários de segredos, mas sim faróis de integridade, cuja palavra, ponderada e justa, ecoa com a força da convicção.

 

Que nosso silêncio proteja, mas jamais oculte a verdade. Que nossa lealdade seja firme, mas nunca servil. Que nossa coragem moral nos impulsione a defender o justo, mesmo em face da adversidade.

 

Irmãos, a confiança é o alicerce da fraternidade e a retidão, o farol que guia nossos passos. Que cada um de nós, imbuído do espírito do Secretário Íntimo, seja um elo forte nesta corrente de luz, servindo à Ordem e à Humanidade com sabedoria, justiça e inabalável integridade.

 

TERCEIRA PARTE

 

Grau 6 - Secretário Íntimo: Leituras Filosóficas

 

Nesta terceira parte será feitas leituras filosóficas do grau 6 tendo como base a Segunda Parte. Esta será referenciada como: “no texto”.

 

I. Albert Pike e a Ética do Silêncio Ativo

 

Mestre Pike, em Morals and Dogma, aponta para o Secretário Íntimo como o ponto de virada entre o silêncio contemplativo e a ação responsável. Ele escreve: O verdadeiro segredo da Maçonaria não é a palavra não dita, mas a sabedoria da ação guiada pelo dever.

 

Este princípio reverbera intensamente no texto, onde o Irmão é exortado a transcender o silêncio do Mestre Secreto para uma atuação ética no mundo — ou seja, trata-se de uma transição do ser para o agir, operada com discrição e integridade.

 

O silêncio, aqui, não é omissão, mas gesto filosófico, ecoando Heidegger, para quem o silêncio (Schweigen) pode ser mais autêntico que a fala, desde que ele contenha a escuta do Ser e o respeito ao mistério que se revela apenas ao Dasein atento. Neste grau, o maçom é aquele que escutou o Ser no silêncio e agora fala, mas fala com retidão, com a sabedoria prática que orienta o agir justo.

 

Em Heidegger, o termo “Dasein” (que vem do alemão e significa “estar aí”) é usado para se referir ao ser humano. Para o filósofo, o ser humano não é apenas alguém que vive no mundo, mas alguém que tem consciência de si, que pensa sobre sua própria existência e se preocupa com o futuro e com a morte. O “Dasein” é aquele que se pergunta sobre o sentido da vida, que se relaciona com outras pessoas e com o mundo à sua volta, e que vive cada momento sabendo que sua vida é finita.

 

II. Nietzsche e a Superação do Servilismo Moral

 

Embora não nomeado, Nietzsche é sentido no texto quando se adverte contra o “servilismo” e a “adulação”. A fidelidade, diz-se, deve ser leal, mas nunca servil. Essa é uma ideia nitidamente nietzschiana: a crítica à moral do rebanho, à submissão que disfarça covardia como virtude. O Secretário Íntimo, ao cultivar a coragem moral, distancia-se da moralidade passiva e assume uma postura afirmativa, trágica, no sentido grego e nietzschiano — o homem que age em nome da verdade mesmo sob o risco do conflito.

 

Giacóia, em Nietzsche e o Niilismo Europeu, salienta que a superação do niilismo requer o reencontro com valores criados a partir da interioridade. Assim, o Secretário Íntimo não se submete à autoridade por temor ou protocolo, mas por uma convicção interna forjada na confiança recíproca e no compromisso com a retidão vivida, não apenas discursada.

 

III. Kant: O Imperativo Categórico e a Lealdade Ética

 

Em muitos aspectos, o conteúdo moral do Grau 6 pode ser relido kantianamente, sobretudo no que diz respeito à retidão inabalável e à fidelidade aos princípios. Quando o texto enfatiza que o Secretário Íntimo deve “manter a retidão mesmo diante da adversidade”, temos uma clara alusão ao imperativo categórico kantiano: age de tal forma que a máxima de tua ação possa ser elevada a uma lei universal.

 

A lealdade do Secretário Íntimo não depende das circunstâncias, da utilidade ou do proveito — ela é deontológica. Seu compromisso ético não é resultado do medo de sanção nem da esperança de recompensa, mas da internalização de um princípio racional e universal: a confiança só pode existir onde há previsibilidade moral e coerência entre palavra e ação.

 

Lembrando que ‘deontológico’ é um termo usado para falar sobre aquilo que está ligado aos deveres e responsabilidades que uma pessoa tem, especialmente em contextos profissionais. Vem do grego — deon quer dizer “dever” e logos significa “estudo” — então, deontologia é basicamente o estudo dos deveres, das regras morais que orientam como alguém deve agir de forma ética no trabalho ou na vida.

 

IV. Heidegger e a Linguagem como Morada da Verdade

 

No trecho “o Secretário Íntimo aprende a arte de discernir o momento oportuno para falar”, há ecos profundos da filosofia de Heidegger sobre a linguagem como a “morada do Ser”. A palavra, aqui, não é mero veículo de comunicação, mas manifestação da verdade. Quando se afirma que “a palavra do Secretário Íntimo não é vazia”, isso remete ao conceito heideggeriano de Rede (discurso autêntico), que se opõe ao falatório (Gerede), à fala vazia e banal da cotidianidade inautêntica.

 

Assim, o Secretário Íntimo, ao “falar com justiça”, não está apenas expressando opinião: ele está revelando o Ser através de um ethos hermenêutico — um modo de ser no qual o Logos se torna ação comprometida. É esse compromisso que Giacóia vê como o cerne da ética do cuidado: a linguagem que cuida é aquela que revela com responsabilidade.

 

V. Giacóia e a Hermenêutica da Responsabilidade

 

Giacóia, especialmente em sua abordagem do niilismo, propõe uma hermenêutica que não apenas interpreta o texto, mas que convida à ação ética. O Secretário Íntimo é, portanto, figura paradigmática do leitor hermenêutico: ele interpreta o mundo e age segundo os valores descobertos nesse processo. Ele é, na expressão de Giacóia, um “guardião da alteridade”, aquele que entende a confiança como relação, como escuta ativa e como cuidado do outro.

 

A “chave da confiança” e a “carta selada” são, assim, símbolos de uma hermenêutica viva, existencial: ler, escutar e agir com responsabilidade — eis o chamado. O punhal da retidão não é instrumento de poder, mas de discernimento: lembrar que todo ato ético é uma decisão, e toda decisão carrega a gravidade da escolha entre autenticidade e inautenticidade.

 

A Figura Hermenêutica da Ética Maçônica

 

O Grau 6 nos apresenta um arquétipo do homem ético que conjuga silêncio e palavra, fidelidade e autonomia, tradição e discernimento. Nele ecoam as vozes de Kant, que chama à retidão; de Nietzsche, que convoca à superação do servilismo; de Heidegger, que adverte para a autenticidade do discurso; e de Pike, que revela o papel do maçom como servo da verdade.

 

Sob o prisma da hermenêutica de Giacóia, o Secretário Íntimo não é apenas um cargo — é uma postura existencial diante da vida e da Ordem. Ele é, acima de tudo, aquele que compreende que a confiança não se exige: se conquista, e a retidão não se proclama: se vive.

 

Hiran de Melo – Presidente da Excelsa Loja de Perfeição “Paz e Amor”, corpo filosófico da Inspetoria Litúrgica do Estado da Paraíba, Primeira Região, do Supremo Conselho do Grau 33 do REAA da Maçonaria para a República Federativa do Brasil.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog