Instrução
do Grau 4: Gilles Deleuze
Inspetoria Litúrgica do Estado da Paraíba – 1ª Região
0225 - LOJA DE PERFEIÇÃO PAZ E AMOR
FUNDADA
EM 11 DE ABRIL DE 1972
CAMPINA
GRANDE - PARAÍBA
Grau 4 – Uma leitura à luz da filosofia de Gilles Deleuze
1. A Verticalidade e o Templo Interior
No texto do Grau 4 (*):
“...este grau nos convoca à intrincada obra da construção interior – a elevação
do Templo espiritual que reside em cada Irmão”.
Essa imagem da "elevação interior"
remete à ideia de um caminho vertical em direção a uma verdade mais alta,
profunda e pura. Mas essa lógica de subir, de se purificar rumo ao centro essencial
de si mesmo, pode ser vista como uma prisão simbólica — uma forma de conter o
pensamento e a existência dentro de estruturas rígidas.
A filosofia deleuziana preferiria outro tipo
de movimento: não o que sobe, mas o que se espalha. Não um templo fechado, mas
redes abertas, rizomas, conexões múltiplas. A libertação não está em descobrir
o “eu verdadeiro”, mas em escapar dele.
“Não é o templo interior que liberta, mas a
fuga do templo. O verdadeiro iniciado não sobe, ele escapa”.
2. O Olho que Tudo Vê e o Controle Invisível
No texto: “...o Olho transcende a mera
percepção visual, erigindo-se como consciência vigilante... juízo
inexorável...”
Esse Olho vigilante é símbolo clássico da
moral interiorizada, da consciência que julga em silêncio — mas julga sempre.
Ele vigia, cobra, compara, pune. Pode parecer iluminação, mas também é
controle.
A filosofia aqui propõe outra saída: não
reforçar a consciência que tudo observa, mas buscar as frestas por onde o olhar
não alcança. Onde há escape, há criação. Onde o olhar do poder não chega,
surgem os movimentos mais livres.
“O Olho que Tudo Vê não enxerga as linhas de
fuga. É nelas que o pensamento se move”.
3. A Chave e o Saber Fechado
No texto: “A chave dos mistérios é confiada
àqueles que demonstram estar preparados...”
Aqui, o saber aparece como privilégio — um
segredo para poucos. A chave vira símbolo de poder, de distinção, de acesso
restrito. Mas o conhecimento, para ganhar vida, precisa circular, atravessar
fronteiras, perder o ar solene e se tornar fluxo.
O saber mais vivo não é o que se tranca, mas
o que se deixa contaminar, transformar, reinventar a cada encontro.
“A chave que abre os mistérios também fecha
as multiplicidades. Abandona a chave, entra pelo fluxo”.
4. Justiça, Verdade, Equidade
No texto: “...três fulgurantes virtudes:
Justiça, Equidade e Verdade”.
Essas virtudes são colocadas como luzes
fixas, valores absolutos. Mas quando se tornam universais demais, essas ideias correm
o risco de esmagar a diferença, de uniformizar o que é vivo e múltiplo.
Em vez disso, é possível pensar em uma ética
da situação, da potência, daquilo que amplia a vida e a capacidade de existir.
Nem tudo precisa caber numa forma. Às vezes, o mais justo é aquilo que escapa à
regra.
“A justiça verdadeira não é um ideal: é o que
acontece quando forças se combinam sem serem submetidas”.
5. O Silêncio e a Sabedoria
No texto: “O silêncio... é a suprema
expressão da sabedoria adquirida”.
Esse silêncio parece carregar uma ideia de
recolhimento sagrado, de sabedoria que se cala. Mas há outros tipos de
silêncio: não o da reverência, mas o do intervalo criativo. O silêncio onde
algo novo começa a surgir, onde as palavras não bastam e o sentido se move
entre gestos, sons, afetos.
“O silêncio do templo não é o silêncio do
devir. A sabedoria não se cala: ela estilhaça”.
6. Acolhida e Fraternidade
No texto: “Acolhida concreta... cheia de
irmãos mestres fragmentados...”
Nesse ponto, o texto se abre. Abandona os
degraus, os segredos, as hierarquias, e toca algo mais potente: o encontro com
o outro, a escuta sem imposição, o cuidado sem sistema. Isso é política no
nível mais sensível — nas pequenas relações, nas trocas que não precisam de
fórmulas.
Esse gesto é o que realmente transforma: não
a regra, mas a presença. Não o ideal, mas o vínculo.
“Acolher é criar um espaço de multiplicidade.
Onde há escuta, há devir”.
7. O Ritual como Processo
No texto: “O ritual é um valioso sinal no
caminho, não o próprio caminho...”
Aqui aparece a ideia de que o ritual não é um
fim, mas uma travessia. Isso já é um movimento interessante. O ritual, quando
não se fecha sobre si mesmo, pode ser espaço de experimentação, de criação, de
sentidos que emergem no próprio fazer.
Não se trata de seguir uma fórmula, mas de
produzir algo com ela. O ritual só vale se se tornar acontecimento.
“Ritual não é forma vazia: é campo de forças.
O caminho não é fixo. Ele acontece”.
Conclusão: O Devir Maçom
A leitura que Gilles Deleuze inspira nos
convida a rever as fundações do Grau 4 — e, talvez, a construir outras. O
Mestre Secreto, mais do que alguém que guarda um saber, pode ser aquele que se
abre ao desconhecido. Que não sobe degraus, mas atravessa caminhos. Que não
busca essência, mas experimenta a diferença.
Não se trata de negar o simbolismo, mas de
fazer dele um motor para a transformação, não uma prisão dourada. A verdadeira
iniciação talvez esteja em criar, em se mover, em fugir — e não em preservar.
“Não procure o templo. Construa máquinas.
Crie devires.
A iniciação está em atravessar fluxos, não em guardá-los”.
Hiran de Melo
Presidente da Excelsa Loja de Perfeição
“Paz e Amor”, corpo filosófico da Inspetoria Litúrgica do Estado da Paraíba,
Primeira Região, do Supremo Conselho do Grau 33 do REAA da Maçonaria para a
República Federativa do Brasil.
(*) Grau 4 – Mestre Secreto, recomendo a leitura para melhor entender o
presente trabalho. Veja no link: https://pazeamorloja0225.blogspot.com/2025/04/inspetoria-liturgica-do-estado-da_15.html |
Descrição da Ilustração
A ilustração retrata uma rede vibrante e
interconectada de linhas e nós, representando um sistema rizomático de
conhecimento e fluxo de informação, contrastando com formas geométricas que
simbolizam estruturas hierárquicas rígidas. As linhas são dinâmicas e fluidas,
criando uma sensação de movimento e fuga das estruturas limitadas. Novos
caminhos e conexões emergem da rede, sugerindo crescimento e expansão.
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