GRAU 7 – Preboste e Juiz: Visões Filosóficas

 

Por Hiran de Melo

 

A partir das ideias de Michel Foucault, podemos analisar o Grau 7 (*) como um exemplo simbólico das formas como o poder, o saber e a construção do sujeito se entrelaçam. Mesmo que o texto do grau tenha um tom espiritual e ético, Foucault nos convida a olhar com atenção para os mecanismos que moldam a forma como cada um governa a si mesmo, por meio de ideias como “virtude” e “justiça”.

 

I.  GRAU 7 – Preboste e Juiz - análise do texto na visão de Michel Foucault

 

1. Estilo e Estrutura do Texto Maçônico

 

O texto do Grau 7 é construído com forte apelo simbólico e moral. Sua linguagem é elevada, mas direta, combinando filosofia, espiritualidade e ética. O tom é solene e reflexivo, adequado ao grau, que representa um avanço na jornada iniciática do maçom.

 

Há o uso de metáforas poderosas — como a balança, a espada e o livro da lei — que ampliam o sentido do texto. Esses símbolos não são apenas visuais: eles representam ideias complexas, como equilíbrio, poder e verdade.

 

2. A Filosofia da Justiça em Albert Pike

 

Albert Pike apresenta a Justiça como uma virtude que está acima de normas externas. Ele propõe que o verdadeiro julgamento não é o que fazemos sobre os outros, mas aquele que realizamos dentro de nós mesmos. Esse é o tipo de Justiça que busca melhorar o indivíduo, não punir o próximo.

Aqui entra o papel simbólico do Juiz: não é um juiz de tribunal, mas um juiz de si mesmo.

 

3. Foucault: O Julgamento e o Poder sobre Si

 

Michel Foucault, filósofo francês, não falava diretamente de maçonaria, mas seus pensamentos ajudam a enxergar o significado mais profundo desse grau. Foucault estudou como o poder funciona na sociedade — e um dos seus temas principais foi o julgamento.

 

Para Foucault, o ato de julgar está ligado ao poder de normalizar, ou seja, de definir o que é certo ou errado, quem está "dentro" ou "fora" da regra. Mas ele também falava que o julgamento mais forte é aquele que exercemos sobre nós mesmos — o que ele chamou de "autovigilância".

 

No Grau 7, vemos isso com clareza: o maçom passa a ser um juiz de si mesmo, olhando para suas falhas e virtudes com sinceridade. Não há mais espaço para máscaras ou justificativas. O julgamento, aqui, é um caminho para a melhoria interior, não uma condenação.

 

A tarefa que se nos impõe é a mais árdua e essencial: julgar a nós mesmos com a firmeza da razão e a compaixão que emana de um coração fraternal”.

 

Segundo Foucault, isso é o que ele chama de “tecnologia de si” – práticas e pensamentos que usamos para moldar nosso comportamento de acordo com normas que aprendemos na religião, na filosofia ou na tradição. Ou seja, esse “eu ético” não nasce sozinho, ele é construído a partir de discursos e símbolos que nos orientam.

 

4. O Poder como Responsabilidade

 

Outro ponto que Foucault traz, e que está presente no Grau 7, é que todo poder exige responsabilidade. O Preboste e Juiz, embora simbolicamente elevado, não é um chefe ou dominador. Pelo contrário, ele é chamado a servir — à Loja, à humanidade e à própria consciência.

 

Foucault nos ensina que quando alguém tem poder (seja sobre outros ou sobre si), esse poder precisa ser equilibrado com ética. Isso se liga perfeitamente ao ensinamento de Pike de que julgar é servir, e que a Justiça deve andar lado a lado com a Misericórdia.

 

5. A Justiça como um Ato de Liberdade

 

Para Foucault, a verdadeira liberdade vem do autoconhecimento e da capacidade de resistir aos sistemas que nos controlam. No Grau 7, o maçom é convidado a resistir à tentação de julgar sem compaixão, de agir sem pensar, de se esconder atrás de rituais vazios.

 

A Justiça aqui é libertadora, porque leva o Irmão a um estado de consciência mais elevado, onde ele assume a responsabilidade por suas escolhas.

 

O Juiz de Si Mesmo

 

Por fim, Michel Foucault nos ajuda a entender que o Grau 7 não é apenas sobre julgar — é sobre se libertar dos próprios vícios e buscar a verdade interna com humildade e firmeza.

 

O texto do Grau 7, quando olhado com os olhos de Foucault, parece mais do que um convite à virtude. Ele funciona como um manual para formar um sujeito ético e disciplinado, alguém que internaliza os valores da Ordem e os aplica em sua própria vida.

 

Esse é um tipo refinado de poder:

 

Não precisa de punição externa, porque o sujeito já se julga por dentro;

Não usa o medo, mas a busca por virtude;

Não impõe à força, mas educa pela consciência.

 

Em vez do chicote, o espelho. Em vez do cárcere, a reflexão.

 

Assim como Pike, Foucault aponta que o mais difícil não é apontar o erro dos outros, mas enxergar os nossos próprios limites, e mesmo assim, continuar nossa caminhada com dignidade.

 

O Preboste e Juiz não é um cargo de poder, mas um posto de serviço.

 

E, como nos lembra Pike e ecoa Foucault:

 

Não há sentença mais justa do que a que damos com o nosso exemplo”.

 

II. GRAU 7 – Preboste e Juiz - análise do texto na visão de Friedrich Nietzsche

 

Ao explorarmos o Grau 7 – Preboste e Juiz –, abrimos um espaço de reflexão que une o simbolismo da maçonaria com a profundidade filosófica de Friedrich Nietzsche. O objetivo aqui é apresentar uma leitura que não apenas respeite a linguagem simbólica e tradicional da Maçonaria, como também a torne acessível à luz de uma filosofia que busca a superação do homem comum: a do pensador de Assim Falou Zaratustra.

 

1. O Estilo do Grau: Linguagem Elevada, mas Prática

 

O texto que descreve o Grau 7 é marcado por uma linguagem formal e simbólica, como é típico nas comunicações maçônicas. Há uma ênfase clara em virtudes, princípios e deveres, o que eleva a experiência iniciática a uma jornada ética e espiritual. Palavras como Justiça, Verdade, Equidade e Consciência são usadas como pilares do ensinamento. Isso se alinha com o estilo próprio dos rituais do R.E.A.A., onde cada grau é um passo de lapidação do ser.

 

No entanto, o texto se esforça para não se perder em abstrações: ele traduz conceitos éticos elevados em atitudes concretas. É uma linguagem que forma, inspira e convida à ação, e não apenas à contemplação.

 

2. A Filosofia de Nietzsche como Chave de Leitura

 

Nietzsche não foi um defensor da justiça nos moldes tradicionais — muito pelo contrário, ele criticava duramente as morais herdadas, especialmente as baseadas na culpa, submissão e autopunição. Mas é justamente aí que ele se encontra com a essência deste grau: na ideia de autojulgamento como ferramenta de superação.

 

3. Julgar a Si Mesmo: o Espírito do "Além-do-Homem"

 

No Grau 7, o maçom é chamado a julgar a si mesmo — e não ao outro. Nietzsche chamaria esse processo de transvaloração dos valores: deixar de seguir valores impostos de fora e passar a criar seus próprios, com base em uma consciência elevada, forte e lúcida.

 

A "transvaloração de todos os valores" representa a reavaliação e reformulação radical de valores morais e sociais, especialmente aqueles que Nietzsche considerava como tendo sido indevidamente invertidos. 

 

Assim como o “além-do-homem” nietzschiano, o Preboste e Juiz não se contenta com padrões herdados; ele busca um aperfeiçoamento constante de si, fundado não na culpa, mas na força interior. Ele julga para transformar-se, não para punir.

 

4. Justiça e Misericórdia: a superação do Juiz Moralista

 

Nietzsche combate o moralismo — aquele que julga para humilhar, controlar ou se elevar sobre os outros. O texto do Grau 7 deixa claro que o julgamento aqui é feito com compaixão e humildade, não com arrogância ou soberba. O verdadeiro Juiz, diz Pike, julga para ensinar — conceito que se alinha ao educador nietzschiano, que forma ao invés de impor.

 

5. O Juiz como Criador de Sentido

 

Nietzsche afirmava que o ser humano deve tornar-se criador de novos valores — um legislador de si mesmo. Isso ressoa com a imagem do Juiz maçônico como aquele que não impõe leis externas, mas vive segundo uma Lei Interna iluminada.

Neste sentido, o Livro da Lei — símbolo presente no Grau — pode ser lido como metáfora da consciência esclarecida. Não se trata de um código externo, mas de uma verdade que o iniciado precisa encontrar e viver de forma autêntica, como um Zaratustra moderno.

 

6. Símbolos e sua Releitura Nietzschiana

 

A Balança – Representa o equilíbrio entre rigor e compaixão. Para Nietzsche, o equilíbrio é uma conquista do espírito forte: aquele que sabe dizer “sim” e “não” a partir de si mesmo, sem medo ou dependência dos dogmas sociais.

 

A Espada – A força da justiça. Em Nietzsche, a espada pode simbolizar o espírito guerreiro, mas não de guerra externa, e sim da luta interna contra nossas próprias ilusões, fraquezas e servidões morais.

 

O Livro da Lei – Se no contexto tradicional ele representa a Moral Universal, em Nietzsche ele pode representar o desafio de criar seu próprio livro — sua própria verdade, sua própria vida com sentido.

 

7. Justiça Nietzschiana: além da Vingança

 

Nietzsche via grande parte da justiça como um disfarce para a vingança dos fracos. O Grau 7 evita essa armadilha ao propor que a Justiça maçônica seja exercida com base na razão e no amor fraternal. O Juiz maçônico não se vinga, não pune por prazer ou moralismo — ele educa, orienta, e, se necessário, perdoa.

 

8. O Preboste como Ideal do Homem Superior

 

O Preboste e Juiz, quando compreendido à luz de Nietzsche, torna-se mais do que um símbolo ritual: ele encarna o ideal do homem que se supera, que não julga pelo ressentimento, mas pela sabedoria. Ele não busca poder sobre os outros, mas domínio sobre si mesmo.

 

Torna-te quem tu és”. – Nietzsche

 

Este chamado nietzschiano ecoa perfeitamente no coração do Grau 7: tornar-se juiz de si mesmo é o primeiro passo para tornar-se senhor de si, e, portanto, um verdadeiro Irmão da Luz.

 

III. GRAU 7 – Preboste e Juiz - análise do texto na visão de Immanuel Kant

 

Ao nos aprofundarmos no Grau 7 do Rito Escocês Antigo e Aceito, nos deparamos com uma das mais nobres funções simbólicas da jornada maçônica: o Julgamento Justo. Este grau nos convida a assumir a postura de Preboste e Juiz, não para julgar o mundo exterior, mas a nós mesmos, à luz da consciência moral. Ao observarmos os ensinamentos desse grau sob a ótica do filósofo Immanuel Kant, descobrimos uma conexão profunda e esclarecedora.

 

A Justiça como Lei Moral Interior

 

Para Kant, a moralidade verdadeira não vem de fora, de autoridades ou tradições, mas nasce dentro de cada pessoa, pela razão prática. Em outras palavras, cada um de nós carrega dentro de si uma lei moral — que Kant chama de “imperativo categórico” — que nos ordena fazer o bem porque é o certo, e não por medo de punição ou desejo de recompensa.

 

Essa ideia está no centro do Grau 7: o verdadeiro Juiz não é aquele que aplica uma lei imposta de fora, mas o que julga a si mesmo com retidão e consciência, sendo guiado pela razão e pela vontade de agir corretamente.

 

O Dever como Chamado do Iniciado

 

Kant ensina que a moral se baseia no dever. Não basta fazer o bem; é preciso fazer o bem por dever. E isso exige liberdade interior. No Grau 7, o maçom é chamado a agir como Juiz imparcial, guiado não por paixões ou interesses, mas por um sentido de dever para com a Justiça, a Verdade e a Fraternidade.

 

É nesse espírito que os três pilares do Preboste e Juiz se alinham com Kant:

 

Guardar a Justiça e a Verdade => agir sempre de forma correta, conforme a lei moral que a razão revela.

Ser exemplo de equidade e retidão => viver com integridade, mesmo quando ninguém está observando.

Julgar é servir, não dominar => a autoridade verdadeira nasce do respeito à dignidade de todos.

 

Símbolos Kantianos no Grau 7

 

Os símbolos do Grau 7 ganham nova luz à medida que os analisamos com base no pensamento kantiano:

 

A Balança representa o equilíbrio racional entre o dever e a compaixão. Em Kant, isso reflete o uso da razão para encontrar o justo meio, onde não se age por impulso, mas por reflexão.

 

A Espada simboliza a força do dever moral: uma força que não fere, mas protege. A espada kantiana é o poder da razão que corta a ilusão e sustenta o bem.

 

O Livro da Lei é o espelho da lei moral universal. Kant diria que esse "livro" está escrito não apenas em pergaminhos, mas na razão de cada ser humano livre e consciente.

 

O Juiz como Ideal Moral

 

Para Kant, o homem moral é aquele que age como se sua conduta pudesse se tornar uma lei para todos. Isso nos ajuda a entender o ideal do Preboste e Juiz: um maçom que não apenas fala sobre justiça, mas vive de modo tão justo que sua vida se torna um exemplo.

 

Quando o Grau 7 nos convida a sermos juízes de nós mesmos, está ecoando diretamente a filosofia kantiana: a ideia de que o maior tribunal é o da consciência moral, onde o homem encontra sua liberdade e responsabilidade.

 

A Justiça como Virtude Suprema

 

Albert Pike ensina que a Justiça é a base de todas as outras virtudes. Kant também acreditava nisso. Para ele, a Justiça é o respeito à dignidade do outro, e nenhuma ação pode ser moral se desrespeitar essa dignidade.

 

Justiça, para ambos, não é apenas castigo ou recompensa. É o esforço constante de agir de forma correta, universal e justa, mesmo quando ninguém está olhando. É o exercício da liberdade moral com responsabilidade.

 

Misericórdia e Razão: Um Encontro Necessário

 

Embora Kant seja conhecido por sua ênfase na razão, ele não é insensível à compaixão. A razão prática nos manda respeitar o outro como um fim em si mesmo, o que implica agir com humanidade, empatia e cuidado.

 

No Grau 7, a Justiça só é verdadeira quando acompanhada de Misericórdia. Isso reflete o espírito kantiano de equilibrar a firmeza da razão com o reconhecimento da fragilidade humana.

 

Irmãos, o Grau 7 nos ensina que ser Juiz é mais do que aplicar regras: é cultivar a nobreza de espírito, a firmeza de caráter e a humildade de reconhecer nossas próprias falhas. Isso é o que Kant chamaria de maturidade moral.

 

E é isso que a Maçonaria nos propõe: sermos construtores não apenas de templos, mas de consciências justas, capazes de agir com retidão mesmo no silêncio, mesmo na dúvida, mesmo na solidão.

 

Que cada um de nós, como Preboste e Juiz, seja juiz de si mesmo com a clareza da razão e a luz da virtude.

 

IV. GRAU 7 – Preboste e Juiz - análise do texto na visão de Gilles Deleuze

 

O Grau 7 do Rito Escocês Antigo e Aceito, o grau de Preboste e Juiz, é uma etapa importante de nossa caminhada. Nele, somos convidados a refletir sobre um dos temas mais nobres da Maçonaria: a Justiça. Mas hoje, proponho olharmos esse grau por um ângulo diferente — pelas lentes do filósofo francês Gilles Deleuze, que nos ensina a pensar de maneira criativa, viva e livre dos modelos prontos.

 

O Julgamento não como fim, mas como processo

 

Para Deleuze, julgar não é o ponto final de uma linha reta. Pelo contrário, ele rejeita a ideia de julgamento como algo que fecha, que limita ou rotula. Em vez disso, ele valoriza o movimento, o processo de criação e a transformação do ser.

 

Aqui encontramos uma ponte com o Grau 7: quando o maçom é simbolicamente feito juiz, não é para condenar, punir ou separar, mas para compreender e reconstruir — a si mesmo, em primeiro lugar.

 

Ser Preboste e Juiz, então, não é ser uma autoridade que aponta erros, mas alguém que, ao se avaliar com honestidade, abre espaço para se tornar algo novo, algo melhor. Isso é profundamente deleuziano: não julgar para excluir, mas para criar.

 

A Justiça como fluxo, não como forma fixa

 

Albert Pike descreve a Justiça como equilíbrio entre razão e compaixão. Para Deleuze, o verdadeiro equilíbrio vem da diferença em movimento, da abertura ao devir — uma palavra que significa transformação contínua.

 

No Grau 7, somos chamados a equilibrar rigor com misericórdia. Deleuze nos lembraria que isso não é um estado que se alcança de uma vez por todas, mas um exercício constante, um fluxo: cada julgamento é uma nova ocasião para agir de forma justa de maneira diferente, conforme a situação, a pessoa e o contexto.

 

A subjetividade criadora: o juiz como artista de si mesmo

 

Deleuze diz que cada ser humano é uma obra em construção. Ele não é apenas aquilo que foi feito dele, mas também aquilo que ele pode vir a ser, por meio da criação de novos modos de viver e pensar.

 

O Preboste e Juiz, quando examina sua consciência, não busca apenas erros a corrigir, mas caminhos novos a seguir. Ele não se limita ao que é esperado ou tradicional. Ele constrói, com base na Justiça, um novo modo de ser maçom, mais íntegro, mais fraterno, mais autêntico.

 

Esse Juiz, então, não aplica regras antigas de forma cega, mas procura viver de modo que sua própria conduta seja uma forma de ensinar — como nos lembra Pike.

 

O símbolo como multiplicidade: uma nova leitura dos elementos do Grau

 

A Balança

 

Não representa apenas equilíbrio fixo, mas um convite constante ao reajuste, como uma dança entre forças. Em Deleuze, esse movimento é a própria vida. O Juiz não “pesa” de forma matemática, mas “escuta” os sinais do mundo e responde com sabedoria.

 

A Espada

 

Símbolo do poder, mas que, à luz de Deleuze, só é legítima quando usada para cortar o que aprisiona e abrir espaço para o novo. A espada do Juiz não é arma de punição, mas ferramenta de libertação de antigos modos de pensar.

 

O Livro da Lei

 

Não é um código fechado. É uma fonte de leitura viva, cheia de sentidos possíveis. Deleuze diria: "não interprete para encerrar, mas para abrir novas conexões". O Livro da Lei, assim, torna-se um convite ao pensamento vivo, que transforma o espírito.

 

A Justiça como produção de harmonia, não controle

 

Para Deleuze, o mundo não deve ser reduzido a um único padrão. Ele valoriza a diferença, a diversidade, a multiplicidade. O Juiz maçônico deve, então, cultivar a Justiça como forma de respeitar os diferentes modos de ser, e não como ferramenta de uniformização.

 

O julgamento que o Grau 7 propõe é interior, contínuo e criador. Ele convida o maçom a cultivar um novo estilo de vida, onde o justo é aquilo que favorece o crescimento da Loja, da Fraternidade e de cada Irmão, como ele é.

 

Fraternidade e Devir: um chamado ético

 

Para Deleuze, a ética não é seguir regras, mas afirmar a vida. No Grau 7, o Juiz ideal não é o que sabe aplicar leis, mas o que vive de forma tão justa que sua presença inspira transformação e liberdade.

 

Esse Juiz é um companheiro de caminhada, não um fiscal. Ele ajuda os Irmãos a se tornarem aquilo que ainda não são, mas podem ser. Ele age não com rigidez, mas com alegria de ajudar no crescimento do outro — como o verdadeiro mestre de si mesmo.

 

O Juiz como criador de sentidos

 

Irmãos, o Grau 7 não é o fim de uma escada de conhecimento, mas um ponto de virada: o momento em que entendemos que julgar, no caminho maçônico, é criar novas formas de viver, de pensar e de se relacionar.

 

Com Deleuze, aprendemos que a Justiça, quando vivida com liberdade, se torna uma potência de vida, e que o Juiz não é aquele que impõe verdades, mas o que ajuda a libertar os caminhos do ser.

 

Que este Grau nos inspire a sermos criadores de Justiça viva, não apenas aplicadores de regras — e que cada Irmão, ao se julgar, abra espaço para um novo homem dentro de si surgir.

 

V. GRAU 7 – Preboste e Juiz - análise do texto na visão de Pierre Bourdieu

 

Ao refletirmos sobre o Grau 7 – Preboste e Juiz – do Rito Escocês Antigo e Aceito (REAA), somos convidados a olhar para a Justiça não apenas como um ideal abstrato, mas como algo que deve ser vivido, julgado e encarnado em nossas atitudes. Para enriquecer essa reflexão, propomos um diálogo entre os ensinamentos do Mestre Albert Pike e as ideias do sociólogo francês Pierre Bourdieu. Embora Bourdieu não fosse maçom, sua filosofia social ajuda a compreender como o conceito de Justiça é vivido na prática — dentro e fora do Templo.

 

1. Estilo do Texto: Forma que Inspira Forma

 

O texto que analisa o Grau 7 é escrito em estilo solene, quase litúrgico, com forte carga simbólica e espiritual. Ele se comunica mais com o coração e o espírito do que apenas com a razão. Usa recursos como repetições ("julgar a si mesmo", "espírito iluminado"), símbolos (espada, balança, livro da lei) e citações impactantes de Albert Pike para tocar a sensibilidade do maçom em busca de elevação moral.

 

Esse estilo reforça a ideia central do Grau: a Justiça como uma virtude transcendente, mais do que um simples código legal. O texto também guia o leitor a uma autoavaliação constante, convocando-o a um julgamento interno — e é aqui que a filosofia de Bourdieu entra em cena de forma interessante.

 

2. O Grau 7 à Luz da Filosofia de Pierre Bourdieu

 

Bourdieu estudou como a sociedade funciona por meio de estruturas invisíveis: habitus, campo e capital. Vamos traduzir isso para o mundo maçônico:

 

a) Habitus: o Juiz dentro de nós

 

O habitus é o conjunto de disposições que formam nosso jeito de pensar, julgar e agir. É como uma "segunda natureza" adquirida com o tempo.

 

No Grau 7, o maçom é chamado a julgar a si mesmo. Isso não é simples: nossas decisões já vêm carregadas por nosso habitus — ou seja, por tudo o que aprendemos na família, escola, religião, etc. Aqui, a proposta iniciática é romper com o julgamento automático, condicionado. O Preboste e Juiz precisa cultivar um novo habitus moral, que seja mais justo, mais consciente e menos influenciado por paixões, preconceitos ou vícios sociais.

 

b) Campo: a Loja como espaço de Justiça

 

Para Bourdieu, a sociedade é dividida em "campos": áreas com suas próprias regras e disputas de poder. A maçonaria é um campo simbólico, onde se joga um jogo diferente do mundo profano.

 

Dentro da Loja, o maçom no Grau 7 é chamado a ser juiz — mas não um juiz para dominar, e sim para servir, como diz o próprio texto. O campo maçônico exige que o Juiz se afaste das lógicas do poder secular (como status ou vaidade) e se aproxime de uma autoridade moral que só se conquista pela retidão de vida. Ou seja: na maçonaria, o verdadeiro poder vem da virtude, não do cargo.

 

c) Capital simbólico: a Justiça como prestígio verdadeiro

 

Em vez de dinheiro ou fama, Bourdieu também fala de capital simbólico: o prestígio que alguém tem por sua honra, sabedoria ou integridade.

 

O Preboste e Juiz não busca aplausos. Seu valor vem da confiança que inspira. Ele acumula "capital simbólico" ao ser justo, imparcial e misericordioso. Isso é bem diferente da Justiça no mundo profano, onde o julgamento muitas vezes é motivado por interesses pessoais ou disputas de poder.

 

3. A Justiça como Virtude Interior e Coletiva

 

Bourdieu ajuda a entender que não basta dizer que somos justos: é preciso olhar de onde vêm nossas ideias de justiça. Elas são ensinadas, reproduzidas, muitas vezes sem perceber. Por isso, o texto do Grau 7 insiste tanto na autoavaliação: só quem conhece a si mesmo pode começar a aplicar a Justiça com equidade.

 

Além disso, a Justiça, como virtude iniciática, só ganha sentido dentro da vida em comunidade. A Loja é o espaço onde treinamos o olhar compassivo, o julgamento sereno e o respeito pelas diferenças — ou seja, onde transformamos a teoria em prática.

 

4. Conclusão: O Preboste e Juiz como Modelo de Ética Viva

 

Se Bourdieu nos ensina que somos condicionados pela sociedade, a maçonaria responde que também somos capazes de superá-la, por meio da iniciação, do trabalho interior e do exemplo pessoal. O Grau 7, portanto, é um chamado à consciência crítica, à humildade moral e à ação justa — e isso vale tanto para o campo simbólico da Loja quanto para os desafios da vida profana.

 

Como resume o próprio texto:

 

O verdadeiro Juiz não julga para punir, mas para ensinar. E sua sentença mais justa é o exemplo que dá com a própria vida”.

 

Reflexão Final: Bourdieu diria que “todo julgamento é socialmente construído”. O Preboste e Juiz responde: “Sim, mas podemos reconstruí-lo com base na Virtude, na Fraternidade e na Luz”.

 

Que cada um de nós seja o Juiz de si mesmo — e nunca o carrasco de seu Irmão.

 

Hiran de Melo – Presidente da Excelsa Loja de Perfeição “Paz e Amor”, corpo filosófico da Inspetoria Litúrgica do Estado da Paraíba, Primeira Região, do Supremo Conselho do Grau 33 do REAA da Maçonaria para a República Federativa do Brasil.

 

(*) Grau 7 – Preboste e Juiz, recomendo a leitura para melhor entender o presente trabalho. Veja no link:

https://pazeamorloja0225.blogspot.com/2025/04/inspetoria-liturgica-do-estado-da_86.html

 

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